Estudo aponta que, mantida situação atual, retirada do trabalho será aos 78 anos em 2060 para não afetar relação de contribuição
Sem novas mudanças nas regras de concessão de aposentadorias e pensões no país, o Brasil precisaria estabelecer uma idade mínima de 72 anos em 2040 e 78 anos em 2060 para manter a chamada razão de dependência dos idosos no mesmo patamar de 2020, segundo estudo feito pelo Banco Mundial de autoria de Asta Zviniene e Raquel Tsukada. A taxa de dependência é a razão de idosos com 65 anos ou mais sobre a população de 20 a 64 anos, considerada economicamente ativa. Esse índice era de 14,909 em 2020.
A reforma da Previdência no país foi aprovada em 2019 e uma das principais mudanças foi a fixação de uma idade mínima de 62 anos para mulheres e 65 anos para os homens. Na ocasião, um dos principais objetivos era controlar o crescimento explosivo das despesas diante das mudanças demográficas: o envelhecimento da população com redução da da taxa de fecundidade.
Esse diagnóstico do Banco Mundial mostra que, mesmo com as mudanças implementadas pela reforma, novos ajustes nas regras de concessão de aposentadorias e pensões serão necessários, já que não há espaço político no país para aprovar uma idade mínima tão elevada, conforme economistas ouvidos pelo Valor. O próprio Banco Mundial destaca ser “impossível” continuar compensando o envelhecimento da população a médio e longo prazos apenas com aumentos da idade mínima.
“Esse resultado é assustador. [Aumento da idade mínima para 72 anos em 2040] não é algo que se sustente politicamente”, disse o especialista em Previdência Luis Eduardo Afonso, professor titular da Faculdade de Economia e Administração da Universidade de São Paulo (FEA/USP).
“Uma nova reforma da Previdência é inevitável. O ideal seria discutir o mais rápido possível. Não acredito em mudança em 2025. Mas é necessário corrigir coisas que não foram resolvidas com a reforma de 2019”, afirmou o especialista em Previdência Social Rogério Nagamine, citando como exemplo de medidas a serem corrigidas a previdência rural e o e o Microempreendedor Individual (MEI).
Segundo a economista de Proteção Social do Banco Mundial, Raquel Tsukada, os ajustes na Previdência precisam levar em conta a sua sustentabilidade fiscal de longo prazo, enquanto as adequações nos seus parâmetros precisam ser feitas considerando avanço na qualidade de vida da população, mudanças na composição demográfica e o aumento da expectativa de vida.
“À medida que a população passa a viver mais e a envelhecer com mais qualidade, devemos passar a discutir um aumento da idade de aposentadoria e o reflexo no tempo de concessão dos benefícios previdenciários. Ainda mais se levarmos em consideração que temos um sistema de benefício definido e que a nossa pirâmide etária está com redução da sua base, devido uma baixa taxa de natalidade e fecundidade, evoluindo na direção de adultos no mercado do trabalho para mais idosos ao longo do tempo”, explicou.
Para ela, ajustes paramétricos como igualar ou aproximar as idades de aposentadoria de homens e mulheres, eliminar diferenças entre as regras para os trabalhadores urbanos e rurais, revisar as contribuições especiais, ajustar as regras da pensão por morte e rediscutir os benefícios mínimos poderiam trazer mais equidade e melhora da sustentabilidade
O estudo do Banco Mundial mostra ainda que apenas 56,4% da população economicamente ativa no Brasil fez pelo menos uma contribuição em 2020 para o Regime Geral da Previdência Social (RGPS). Em 2020, existiam 32,2 milhões de beneficiários do RGPS e do Benefício de Prestação Continuada (BPC), sendo que apenas 20,7 milhões de brasileiros de fato tinha 65 anos ou mais. Isso acontece porque antes não havia a existência de idade mínima de aposentadoria e porque 11% das pessoas acumulam benefício, como aposentadoria e pensão. Tudo isso traz pressão para a sustentabilidade da previdência brasileira.
Raquel Tsukada avalia que, apesar das últimas reformas feitas, o sistema previdenciário brasileiro ainda enfrenta desafios. “Essa não é uma característica única do Brasil, mas a diferença é que outros países na região já deram passos mais robustos para enfrentar a mesma situação”, afirmou.
Ela cita, por exemplo, que o Chile foi o primeiro país da América Latina a implementar o sistema de capitalização, em 1981, enquanto o México adotou um sistema misto em 1997, com uma aposentadoria mínima para proteger os mais vulneráveis e camada de capitalização para os demais cidadãos.
A necessidade de aumento da idade mínima para manter constante a taxa de dependência do idoso não é uma realidade apenas brasileira. Segundo o estudo do Banco Mundial, todos os países da América Latina e Caribe teriam que elevar a idade mínima para manter constante o patamar de adultos financiando as aposentadorias dos idosos.
O que chama atenção no Brasil é o acelerado envelhecimento da população quando comparado com outros países. Por exemplo, a Europa duplicou a taxa de dependência de 15 para 30 em 70 anos. Nos países da América Latina e Caribe, dobrará em 25 anos. No Brasil, no entanto, isso vai acontecer em 23 anos. “Ou seja, os países europeus tiveram muito mais tempo para ajustar suas políticas, inclusive de Previdência, do que o Brasil terá”, informa o estudo.
“Em números precisos, o exercício nos mostra que, por exemplo, a Argentina precisaria subir a idade de aposentadoria em 2040 a 68 anos e 72 em 2060. O Chile está mais como o Brasil, com 73 anos em 2040 e 78 anos em 2060. Países onde a taxa de envelhecimento é mais acentuada, sofrerão mais, requerendo mudanças mais acentuadas”, informa o estudo.
Fonte: Valor O Globo, Agosto/2024.