
Política monetária restritiva e atividade menos aquecida devem desacelerar investimentos em máquinas e equipamentos
Depois de crescer 9,1% em 2024, a produção de bens de capital no mercado interno deve desacelerar em 2025, apontam especialistas consultados pelo Valor. A perda de ritmo teve início no último trimestre do ano passado e deve continuar neste ano, com a previsão de enfraquecimento da atividade econômica devido à política monetária mais restritiva.
O setor de bens de produção, que engloba máquinas e equipamentos utilizados para produção de outros bens, representa cerca de 8% da indústria brasileira. Seu crescimento está relacionado à ampliação de parques produtivos e à modernização de maquinário. Por essas características, o segmento é considerado uma espécie de termômetro sobre a disposição de investimentos na economia.
A produção de bens de capital cresceu 9,1% em 2024, segundo a Pesquisa Industrial Mensal – Produção Física (PIM-PF) de dezembro, divulgada nesta quarta-feira pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Mas o mais recente relatório da Tendências Consultoria projeta crescimento menor, de 1,9% da produção nacional de bens de capital e em 2025. Além da previsão de expansão tímida do crédito, resultado da política monetária mais restritiva, o cálculo também considera projeções mais modestas sobre a massa de rendimentos do trabalho.
O pesquisador do IBGE André Macedo, coordenador da PIM-PF, ressalta que o crescimento do setor em 2024 deve ser analisado sob alguns aspectos. O primeiro deles é a base de comparação depreciada, uma vez que a produção de bens de capital acumulou dois anos de resultados negativos, em 2022 e 2023. Macedo também destaca a perda de fôlego no último último trimestre devido ao contexto macroeconômico. Em outubro, a indústria geral já havia caído 0,2%, em novembro, 0,7%; e 0,3% em dezembro.
“Isso pode sinalizar algum tipo de reflexo do aperto da política monetária com o aumento da taxa de juros, com reflexos no nível de confiança dos empresários e na decisão de consumo por parte das famílias. O câmbio em patamar mais alto também traz uma pressão de custo para as empresas”, diz ele.
O atual ciclo de alta nos juros teve início em setembro de 2024, quando o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) elevou a Selic de 10,50% para 10,75% ao ano. Na semana passada, o colegiado elevou a taxa básica de juros para 13,25% ao ano, com sinalização de nova alta de 1 ponto percentual para março. O mercado já espera que a taxa Selic chegue a 15% ao fim de 2025 e elevou para 5,50% a projeção de inflação este ano, de acordo com o último Boletim Focus do BC.
O cenário econômico, somado às incertezas sobre um ajuste das contas públicas, indica que a desaceleração pode se acentuar ao longo de 2025, afirma a economista Yasmin Riveli, analista da Tendências.
“O começo do ano ainda deve ter taxas relativamente fortes em termos de nível de produção dos bens de capital, até porque a alta dos juros leva um tempo para bater. Mas o decorrer do ano tem perspectiva de desaceleração bem expressiva do desempenho da economia como um todo”, diz.
Rafael Cagnin, economista do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), ressalta que a produção industrial é mais sensível aos juros não só pela necessidade de financiamento, mas também pelo chamado custo de oportunidade.
“Quando você aumenta os juros, você automaticamente bloqueia investimentos com uma expectativa de retorno menor que os juros praticados na economia. Então isso paralisa mesmo projetos de investimento e, consequentemente, afeta em cheio a indústria de bens de capital”, diz Cagnin.
Em relação às atividades industriais, a produção de caminhões deve crescer de forma mais moderada em 2025, na comparação com 2024. Por outro lado, a previsão otimista para o setor da agropecuária, com expectativa de safra recorde de soja, e evolução dos investimentos privados em infraestrutura e energia devem ser as influências positivas do setor.
A desaceleração da atividade, o aperto das condições financeiras e a redução das condições fiscais também devem influenciar o resultado das importações. Dados da balança comercial mostram que a importação de bens de capital cresceu 20,6% em valor, com alta de 25,6% em volume em 2024.
‘Câmbio em patamar mais alto também traz pressão de custo”
— André Macedo
“Você teve essa onda de investimentos, mas já está se projetando que para 2025 o crescimento vai ser necessariamente menor”, diz a economista Lia Valls, pesquisadora associada do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre).
Ela explica que além de a importação ser sensível à variação da renda, a volatilidade cambial impõe maior cautela à realização de investimentos. “O câmbio não está só desvalorizado, como está muito volátil”, observa.
Valls completa que as incertezas com a chegada de Donald Trump à Presidência dos Estados Unidos e a implementação de sua política tarifária têm exigido ainda mais cuidado por parte dos investidores.
Riveli pontua que não é esperada uma reversão abrupta, dado que o recuo, se confirmado, será em cima de uma base forte de crescimento.
A analista também chama atenção para a particularidade das importações chinesas, que cresceram 47,8% em volume no ano passado, e devem continuar incidindo sobre a balança comercial brasileira este ano.
Há ainda uma possibilidade de que esse movimento se acentue com o governo Trump nos Estados Unidos, o que levaria a um desvio das exportações chinesas para outros mercados.
O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), José Velloso, diz que o movimento já vinha sendo percebido pelo setor antes mesmo da chegada de Trump à Casa Branca. “As principais origens de máquinas e equipamentos ao redor do mundo tiveram queda de participação no mercado brasileiro, exceto a China”, diz.
“Então a notícia isolada de que o Brasil aumentou a importação de bens de capital denota apenas um ganho de competitividade dos chineses, e não um aumento de investimentos no Brasil”, critica.